Fala-se do mérito e da avaliação a propósito de tudo e de nada, e principalmente utilizam-se estas palavras para se justificarem os salários. É comum ouvir-se dizer que quem quer bons políticos tem que lhes pagar bem, ou que devido à má produtividade os portugueses recebem baixos salários e aumentos muito pequenos.
Regra geral quem usa com muita frequência o termo, mérito, é também quem está na posição de avaliador desse mesmo mérito, pelo que invariavelmente o conceito do mérito acaba quase sempre por sair desvirtuado.
Há poucos dias foi solicitado a um amigo meu, ainda funcionário público, que procedesse à sua autoavaliação, processo este que fez por via electrónica. Para quem não sabe, o funcionário, é confrontado com objectivos, que podem ir de 3 a 5, e à frente de cada objectivo tem de escolher uma das três opções referentes ao que acha que foi o seu grau de realização dos objectivos fixados. As hipóteses são – 1ª Superei claramente os objectivos, 2ª Cumpri os objectivos, e a 3ª Não cumpri todos os objectivos. Claro que não estou a falar de pessoal dirigente, neste caso.
Dizia-me o meu amigo que perante o que leu só podia mesmo ser hipócrita, e armar-se em esperto. Fiquei algo confuso com a sua tirada, mas ele explicou-me logo de seguida.
- Se eu assinalar que cumpri os objectivos, o meu avaliador tem todos os argumentos para me dar uma classificação qualquer, e mesmo que o recurso de nada valha, o avaliador tem sempre à mão o próprio julgamento emitido por mim, que não deixa margem para dúvidas a quem não me conhece nem sabe efectivamente qual é o meu desempenho. Pelo contrário, se eu disser que superei claramente os objectivos, terá de ser o avaliador a explicar porque é que não me dá a nota máxima. Claro que é sempre possível fazer as coisas melhor, e esse é o objectivo genérico dos objectivos, mas porque razão não hei-de eu ser bem classificado, se mais ninguém quer sequer fazer as minhas funções nem aceitar as mesmas responsabilidades?
Perante esta lógica, simplista para alguns, mas verdadeiramente irrefutável, fiquei ainda mais convencido de que não pode haver justiça com este método de avaliação, porque logo à partida foi dito a este meu amigo, que talvez viesse a haver uma nota máxima para ser atribuída nesse serviço, mas que essa estava reservada para o número dois da hierarquia, pelo que todos os outros se teriam de contentar com notas inferiores.
Calculo o sentimento de impotência de todos os que trabalham nesta unidade orgânica, e que estão excluídos de classificações de mérito. Se as coisas correram bem no último ano, como parece ter sido o caso, as chefias levam os louros e colhem os méritos, se por acaso as coisas tivessem corrido mal, a culpa era certamente dos subordinados, que eram incompetentes e que não tinham cumprido nenhum dos objectivos propostos.
Assim se premeia o mérito, assim se incentivam os funcionários, assim é que se pretende avaliar os funcionários públicos!
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