quarta-feira, março 03, 2021

LUIZ DE CAMÕES

A 10 de Junho de 1580, Luiz Vaz de Camões, sentindo que se acercava o seu final, escrevia a D. Francisco d’Almeida:

 

Ao menos morro com a Patria

 

O ódio e a inveja que tinha provocado a publicação dos Lusiadas, a miséria, o escolheram Diogo Bernardes para cantor dos futuros triumphos de D. Sebastião, arrematados a 4 d’agosto de 1578 no tremendo desastre de Alcacer –Kibir, onde uma espada traçou nos desertos ardentes da Lybia o epílogo tristissimo d’uma grande epopeia, obrigando a nacionalidade portugueza a descer ao tumulo amortalhada na púrpura d’um velho cardeal, tudo isto annuveou a fronte do poeta.

 Serviu a sua pátria denodadamente, sacrificando-se, tanto a amava, como elle próprio nos diz:

 

Para servir-vos braço ás armas feito,

Para cantar-vos mente ás musas dada,

 

Na célebre gruta que em Macau perpetua o seu nome, compoz os Lusiadas, que constituem uma verdadeira gloria nacional, a Biblia d’um povo.

Foi obscuramente sepultado na egreja de Sant’Anna, da irmandade dos sapateiros.

O Atheneu Commercial, que se fundou em Lisboa por occasião do tricentenario de Camões, tomou d’esta vez a iniciativa de realizar uma romaria á estatua de Camões que foi concorridissima, mas a que faltou a parte estética, visto que uma agglomeração de gente empunhando estandartes a passar durante horas assume o tom da monotonia.

Junto do monumento falaram varios oradores, emquanto a base do pedestal ficou juncada de flores.

Eis duas quintanilhas do genial cantor de Nathercia e que são primorosas:

 

Os bons vi sempre passar

No mundo graves tormentos,

E  para mais vi sempre andar

Em mar de contentamentos

 

Cuidando alcançar assim

O bem tão mal ordenado.

Fui mau;mas fui castigado

Assim, que só para mim

Anda o mundo concertado.

 

E para provar o seu espírito epigramatico:

Encontrando-se Camões com o duque de Aveiro, como este soubesse que o poeta não tinha nada para comer, perguntou-lhe o que desejaria da sua mesa, respondendo-lhe que bastava uma gallinha.

Só quando acabou de jantar é que o duque se recordou da promessa, e mandou-lhe uma porção de vacca, recebendo de Camões os seguintes versos:

 

Já eu vi o carniceiro

Vender a vacca por carneiro;

Mas não vi, por vida minha, Vender carne por gallinha

Senão o duque de Aveiro.

 

 Texto de Portugal da Silva na Revista Serões nº 73 de 1911


 

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